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Baú de Recordações | Mirita Casimiro


Mirita Casimiro nasceu em Espinho a 10 de Outubro de 1914, tendo-se mudado com os pais para Viseu ainda com dias.
Desde jovem que Mirita sentia especial atracção pelo mundo do Teatro, pois era frequente fazerem-se, em Viseu, récitas para angariar dinheiro para os bombeiros e Mirita participava nesses espectáculo com toda a sua família. Aí começou a dar nas vistas e numa das récitas estaria presente um senhor importante ligado ao meio teatral que a vê representar e fica siderado com o seu talento nato, convidando-a de imediato a vir para Lisboa onde ingressaria numa companhia de Teatro. Apesar disso a jovem não viria tão cedo para a capital, pois os avós não permitiram que Mirita aceitasse tal proposta.

Em Lisboa, Mirita foi sempre acompanhada pela sua família no início da sua carreira, pois a carreira de actriz não era vista com bons olhos ainda mais sendo Mirita filha de boas famílias. Contudo, o dinheiro começou a escassear e a vinda de Mirita para o Teatro foi uma necessidade, pois a actriz tornou-se a fonte de rendimento da família durante largos anos.
Mirita estreia-se então em 1934 na revista Viva a Folia!, levada à cena no Teatro Maria Vitória pela companhia de Maria das Neves, para cantar, mas depressa conseguiu obter pequenos papéis até que começa a dar nas vistas e um grupo de autores, já consagrados à época e entre os quais se encontrava Vasco Santana, começa a escrever para ela um filme... Em 1936 estreia-se no cinema com o celebérrimo filme Maria Papoila, que a lançaria para o estrelato, onde interpretava o papel de uma jovem beirã que vinha para Lisboa servir em casa de uma família abastada.
Apesar de ter sido o único filme feito por Mirita durante largos anos, pois a actriz só voltaria ao cinema em 1968, a película teve um enorme sucesso na época, tanto em Portugal como no Brasil, e para a rua saltaria a canção Canção da Papoila, que até hoje todos cantamos. 
Mirita Casimiro imprimiu na personagem os traços requeridos e tornou-a uma figura popular, que depois várias vezes foi recriada no Teatro de Revista. A força que Mirita emprestava à sua personagem era a mesma que tinha no dia-a-dia e que utilizou ao longo da sua vida para ultrapassar os momentos mais complicados e até trágicos.
A partir de Maria Papoila a actriz divide-se entre o Teatro de Revista e, principalmente, a Opereta, onde se tornou rainha.
Em 1936 obtém o seu primeiro grande sucesso no Teatro ao interpretar o papel de ardina, em travesti, na peça João Ninguém, que esteve em cena no Teatro Variedades e, seguidamente, na revista Olaré Quem Brinca! alcança o lugar de primeira figura absoluta e tem um dos seus primeiros grande sucessos no Teatro de Revista, quase sempre interpretando textos de Vasco Santana, Alberto Barbosa e José Galhardo. E é precisamente com Vasco Santana que se viria a casar em 1941, um casamento que durou por quatro anos mas sempre rodeado de alguma controvérsia, pois eram frequentes as discussões e zangas.
Em 1945 Mirita Casimiro surge na opereta A Invasão, ao lado de Vasco Santana. A peça conquistou um enorme sucesso e a actriz tinha aí um desafio de fogo, pois interpretava duas personagens, uma portuguesa e uma francesa. E foi exactamente em A Invasão que Mirita criou uma canção conhecida até hoje mas que muito poucos sabem que foi ela a criadora... Chamava-se Lisboa Não Sejas Francesa... O público conhece na voz de Amália, mas foi Mirita Casimiro a sua criadora.
Seguiu-se a revista Alto Lá com o Charuto! e, mais uma vez, a peça foi um êxito tremendo, pois naquela altura a censura havia-se tornado mais leve e naquela revista dizia-se o que até ali era impensável. Mas foi Sol de pouca dura e Salazar voltou a apertar...
Estes anos foram, sem sombra de dúvida, o auge de Mirita Casimiro, onde participou em variadas peças como O Brasileiro Pancrácio, O Colete Encarnado, Alerta Está!, Cantiga da Rua, Chuva de Filhos, ao lado de Eunice Muñoz, entre outras peças, e foi simultaneamente o princípio do fim.
Em 1946 separou-se de Vasco Santana, uma separação que causou um grande sururu pois falava-se em infidelidades mútuas, e que para Mirita foi um balde de água fria, pois ficou um ano sem trabalhar e a partir daí a sua carreira perdeu todo o fulgor que tinha, visto que se vivia numa sociedade conservadora e que pouco mudou entretanto.
Mirita, que havia sido a estrela máxima da opereta em Portugal, deixa de ter grandes papéis de operetas, pois um dos autores dessas operetas de êxito era Vasco Santana e além disso depois de A Invasão o público começou a despegar-se da Opereta e hoje em dia já nem sequer se ouve falar nesse género teatral. Desapareceu por completo. A sua carreira é interrompida durante um ano, o suficiente para o público começar a esquecê-la, e mesmo depois do seu regresso a carreira perdeu o fulgor.
Regressou em 1948 ao Teatro Maria Vitória, pela mão do empresário Rosa Mateus, e aí fez cerca de 4 revistas, ao lado de Estevão Amarante, já sem o sucesso nem as montagens exuberantes que havia tido enquanto trabalhava com Piero. Nessa altura já Mirita aparecia pouco nas revistas e nos jornais e o público, que sempre foi e continua a ser injusto e desmemoriado, começava a não ligar muito aquela que foi uma das nossas maiores actrizes.
É então que, em 1949, Mirita resolve tornar-se empresária precisamente do Teatro Maria Vitória e reabri-lo com o seu primeiro grande sucesso que foi João Ninguém. Mas nessa altura Mirita já tinha perto de 40 anos e já não transmitia a frescura requerida pelo personagem. A peça manteve-se alguns meses em cena, mas sem grande corrente de público. Seguiu-se a peça Isaura, a Galinheira e outras no Maria Vitória, até que em 1956 Vasco Morgado tenta relançar Mirita na peça Touros de Morte, ao lado de Laura Alves.
Mas a peça fracassou, apesar de toda a expectativa e curiosidade em torno da produção, estando pouco tempo em cena e a actriz resolveu partir para o Brasil, onde permaneceu por um período de 8 anos, sempre a trabalhar.  Ao longo desses 8 anos fez revista, rádio, televisão, rádio, show e teatro. 
Foi para o Brasil contratada por 4 meses e acabou por ficar mais 4 meses contratada e quando preparava o regresso a Portugal recebe um convite para continuar no Brasil e foi trabalhar para as cidades do Norte do Brasil em várias companhias, enquanto actriz convidada, e depois disso começou a trabalhar sozinha em terras de Vera Cruz, encenando, escrevendo e representando.
No Brasil chegou mesmo a representar todas as peças de Júlio Dantas, que à época eram desconhecidas no Brasil.
Em 1964 a actriz regressa do Brasil, discretamente apesar de ter sido comentado em alguns jornais e na televisão, e é convidada por Carlos Avilez para integrar a recente companhia do Teatro Experimental de Cascais, sendo a protagonista de uma peça que nunca ninguém pensaria que ela poderia representar... A Casa de Bernarda Alba. A peça foi um êxito devido ao facto de ter sido o regresso de Mirita e porque havia a curiosidade de saber como ía uma actriz de revista e de opereta numa peça tão violenta emocionalmente.
Seguiram-se na mesma companhia as peças O Mar, A Maluquinha de Arroios, D. Quixote e As Bodas de Sangue.
Em 1968 tudo parecia dar certo para Mirita Casimiro e a sua carreira parecia renascer das cinzas quase que como milagre.
Estreou a peça O Comissário de Polícia, também no TEC, esgotando todos os dias a sala e sendo aplaudida freneticamente pela plateia, regressou ao cinema com grande sucesso no filme Um Campista em Apuros e fez bastantes trabalhos na TV como Teatro Televisivo e récitas, reaparecendo em várias entrevistas.
O público voltava a entregar-se por completo a Mirita e a actriz preparava já o seu regresso ao Porto com uma grande peça de Teatro, mas o destino atraiçoou-a e Mirita Casimiro sofreu um gravíssimo acidente de viação no Porto que a deixou incapacitada e a impediu de voltar a trabalhar. De um momento para o outro tudo se desmoronou.
Foi-lhe prestada uma última homenagem no Teatro Monumental em Lisboa, mas Mirita não resistiu e em 1970, com apenas 55 anos, suicidou-se.
Triste, amargurada e precocemente envelhecida Mirita colocou fim à sua vida, apagando-se assim uma das maiores e mais brilhantes estrelas de todos os tempos, tão injustamente esquecida nos dias de hoje.
Para Mirita Casimiro, esteja onde estiver, o nosso aplauso de pé e a certeza de que mais vezes será relembrada aqui!